segunda-feira, 30 de junho de 2008

Sede

.
fenda
na pele
alma
minha
em estado
gotejante
de ambulante
em desertos
errante
em
água de sal
degenero
desidrato
sacia-me
beija-me
Ana Oliveira

Ecos do silêncio

.
solos de guitarra flamenca
morrem no ar
sementes regadas a rum
germinam no solo
.
do lado de cá do espelho
a bela adormecida
embebeda-se de sonhos
.
e dedilha alucinadamente
o fio da navalha
Euza Noronha - A Loba

Aceitação

.
Vem Amor
mas venha logo
venha agora
.
que tudo é tudo
e eu te espero
aqui:
.
na minha casa
na minha cama
na minha carne
.
- ou na sua.
Wilson Guanais

sexta-feira, 27 de junho de 2008

O Baile

.
Antes a valsa
Alegre rodada,
Ligeira, marcada
Íamos os dois
A rodopiar.
Ouvidos alertas
Os corpos eretos,
Os pés mui atentos
Corações palpitantes
E a valsa a tocar.
.
Acordes finais,
A valsa acabou.
Pares desfeitos
Olhares refeitos
Posturas,
Mesuras
Todos perfeitos
Num canto afastado
Olhar estudado
Instinto aguçado
Me sinto enlevado
.
Te olho
Me olhas,
Sorrio
Sorris.
Te chamo
Tu vens.
.
Recomeça a musica
Reconheço o ritmo
Nada mais sugestivo
Bolero.
Quiçás, quiçás, quiçás...
Te enlaço e
Bailamos,
Aos sonhos nos entregamos
Quiçás, quiçás, jamais!
.
Te beijo,
Me beijas.
os olhares se cruzam,
os lábios unidos
não podem falar.
As mãos aloucadas
Em busca frenética,
Te apalpam,
Me apalpam,
Com força,
Sem meta,
Instintos acesos,
Voamos com as pernas
Corremos com afã,
Buscamos a alcova,
Dos nossos delírios
Dos nossos desejos
.
Te dispo,
Me dispo,
Te abraço,
Me abraças,
Sinto teu peito arfar,
Vejo teus seios
Subirem e descerem
No ritmo de tua respiração.
Minhas mãos percorrem,
Sem rumo ou nexo
Teu corpo, tuas pernas.
E então fazemos amor,
Nos consagramos ao sexo.
Depois,
extenuados,
Num abraço apertado,
Dormimos apaixonados.
M. Chammas

Terra fértil no sertão

.
No ódio,
No ódio encontrou o almejado amor perdido,
para amor novo eis escolha,
foi obrigada a enfrentar o ódio antigo,
desfazer as mágoas de antes no agora.
.
Na ironia das linhas tortas e palavras certas,
teve que abrir mão do que seja:
orgulho, aprendizado, metas,
Em razão do primeiro beijo,
origem de setas.
.
Ponto final.
Início de outro capítulo.
Longo, único e último capítulo.
.
Deixou de olhar a sujeira no rosto do marginal,
para ver as janelas da alma do marginalizado.
Deixou de ouvir o barulho,
para escutar a canção da revolta entre linhas.
Deixou de ser parede,
para ser porta aberta.
.
Deixou de ser parede,
para ser porta aberta!
Silas Delgado

Aquele olhar

.
Normalmente fico bem,
assim feliz, mesmo que meio triste.
Quando me deparo com aquele olhar,
o maior, um sol, um lago, parece que vôo.
Não! Engano-me. Sou lançado longe
por detrás da sétima camada da alma
e bato, me quebrando todo, no áspero granito.
.
Forço-me e quero ficar bem,
assim feliz, apesar do baque na pedra.
Quando me deparo com aquele olhar
o menor, pequena chama, gota d’água, parece que vôo.
Não! Engano-me. Sou arremessado longe
por detrás do sétimo sonho perdido
e caio, me quebrando todo, no áspero granito.
.
Mas,
apesar dos baques
o que mais quero a cada dia
é rever aquele olhar,
Única prova de que na vida pode haver
amor.
Dauri Batisti

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Consideração

.
Por favor, abuse de tua liberdade ao meu lado
.
Comigo, você poderá sempre procurar a paisagem mais bonita
Comigo, você poderá sempre respirar os ares de suas escolhas
.
E só espere de mim as cenas de ciúme mais delicadas
.
Daquelas melhores que qualquer declaração de amor
Daquelas que quando se nota só se sabe revidar com um beijo
.
Porque o meu amor só te cercará de respeito e segurança
.
E nada que censure o teu sorriso eu serei capaz de fazer
Pois foi assim que aprendi com meus pais
E é só assim que eu quero te ter.
Carlos Valini

Concepção

.
Corpos nus,
respiros cheios
de RRs e UUs.
Corpos molhados
de suor e pus.
Pus que não é pus.
Virilidade, natureza,
amor, calor,
maturidade, pureza.
Claridade de desejos,
escuridão de mentes .
Cobertas espalhadas,
cabelos emaranhados,
gemidos animalescos,
pudores libertados,
biologia,
sexologia,
tara, paixão,
embriagues, ilusão,
frenesi, exaltação.
.
Nesse quadro tão nojento,
ignóbil até,
surge milagrosamente,
cheia de pujança,
p'ra pecar no mundo
mais uma criança...
M.Chammas

No te vas

.
te quiero por la noche
de amor y pasión
en medio del imposible
.
me gusta cuando me hablas
me gusta cuando me quieres
tu ausencia es dolor para mi
.
ahora que te quiero tanto, no te vas
.
ahora que te quiero tanto, búscame tu
Ana Oliveira

terça-feira, 24 de junho de 2008

Sem compromisso

.
faz-me falta
o risco
sem compromisso
e adorno.
.
rabisco rabisco
.
e o canto do olho
insistindo o sentido
é o próprio cisco
em que me recolho.
.
amanhã, quem sabe
dessignifico.
.
amanhã, quem sabe
um risco novo.
Célia de Lima

Propaganda

.
Comprando o que parece ser
Procurando o que parece ser
O melhor pra você
Proteja-se do que você
Proteja-se do que você vai querer
Para as poses, lentes, espelhos, retrovisores
Vendo tudo reluzente
Como pingente da vaidade
Enchendo a vista, ardendo os olhos
O poder ainda viciando cofres
Revirando bolsos
Rendendo paraísos nada artificiais
Agitando a feira das vontades
E lançando bombas de efeito imoral
Gás de pimenta para temperar a ordem
Gás de pimenta para temperar
Corro e lanço um vírus no ar
Sua propaganda não vai me enganar
Como pode a propaganda ser a alma do negócio
Se esse negócio que engana não tem alma
Vendam, comprem
Você é a alma do negócio
Necessidades adquiridas na sessão da tarde
A revolução não vai passar na tv, é verdade
Sou a favor da melô do camelô, ambulante
Mas 100% antianúncio alienante
Corro e lanço um vírus no ar
Sua propaganda não vai me enganar
Eu vi a lua sobre a Babilônia
Brilhando mais do que as luzes da Time Square
Como foi visto no mundo de 2020
A carne só será vista num livro empoeirado na estante
Como nesse instante, eu tô tentando lhe dizer
Que é melhor viver do que sobreviver
O tempo todo atento pro otário não ser você
Você é a alma do negócio, a alma do negócio é você
Corro e lanço um vírus no ar
Sua propaganda não vai me enganar

Jorge Du Peixe, Rodrigo Brandão E Gilmar Bolla 8

Amar

.
é ter-te
até ao limite
do non sense
em asa delta
sem fronteiras
sem barreiras
pisar contigo
a mesma areia
e
de pés descalços
sentir o mar
.
é ter sede de ti
é ter teu corpo
e contigo comungar
a mesma lua
o mesmo copo
o mesmo prato
a mesma cama
.
é querer-te a voar
sem te prender
ser teu apoio
ser outra parte
ser teu porto
teu sussurro
teu silêncio
Ana Oliveira

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Primeira Página

.
Abro o caderno como quem
abre o dia. Páginas claras,
limpas contam dos afazeres,
obrigações, esquecimentos...
(Anoto para esquecer)
Esqueço para poder sonhar:

- Escrevo para encontrar!
Maria Cláudia Mesquita

Sonho Real

.
Me sinto perdido
na imensidão do mar,
Ofegante,
cansado,
tento respirar.
Busco a calma,
a aflição
me embebeda a alma.
.
Olho à frente
e vejo bem perto,
uma praia.
Lá está a segurança,
a salvação.
.
Percebo
na linha do horizonte,
silhueta marcante
de uma palmeira.
linda e altaneira.
Figura delirante ?
Parece uma mulher,
insinuante,
elegante,
corpo esguio,
alucinante
.
Projetados
desse corpo,
dois frutos,
dois cocos.
Lembram
dois seios
deslumbrantes
cheios
de vida e viço.
.
As ramas
balançando ao vento,
parecem
cabeleira solta.
Firmo mais
o olhar
e vejo teu rosto
completando
a cena.
.
Tenho vontade
de correr.
Para você.
tento nadar
e a maré impede.
Na praia,
as pedras eu sei,
vão impedir
ao máximo
nosso contato.
.
Exangue,
cansado,
triste.
desanimado,
reconheço
a ilusão de
te abraçar e amar.
Fecho os olhos,
largo os braços
e me entrego
ao destino.
Sem ti, viver.
Morrer sem te Ter...
Miguel S.G. Chammas
.
A identidade está necessariamente ligada à diferença, supõe a diferença e que a diferença supõe a identidade, correspondendo ao estado real das coisas.
Hegel

.
não me toquem
pois minha pele arde.
envolvo-me em mim
num estado fetal
sem esperança
ou sorrisos vãos.
tudo ficou inerte,
até o tempo
onde vegeto
Ana Oliveira

sábado, 21 de junho de 2008

Cicatriz

.
Aquele que foi único ninguém esquece
Damos um tempo, dá-se umas voltas
Mas vira e mexe ele aparece
.
Surge do nada
Liga na Madrugada
A gente não entende
Mas atende
.
E o que o traz quase sempre é nada
O que a gente sofre quase sempre é tudo
Sempre estamos com tudo e com nada, palhaçada
.
O papo é confuso
Ficamos engasgados
A ligação dura pouco
E a noite dura o dobro
.
Eu já nem me lembrava da brisa do mar
Ou daquele ciúme que me incomodava
E ainda espero esquecer...
Mas será que quero mesmo?
Ninguém pode...
.
Nada apaga a memória da gente
Uma vez grande amor
Pra sempre saudade latente...
Carlos Valini

Explosão

.
Para te dar
fico sem corpo,
fico sem mim.
.
Meu intelecto pára
e minha generosidade
explode em você.
.
Dou-te a minha essência,
o meu âmago.
Dou-te a medula
da minha alma.
Ana Oliveira

Umbigos, virilhas e pentelhos

.
§Sou um cara sem a misericórdia de um guardanapo que mal serve como rascunho para meus versos falsos. As cantadas tolas sempre falham, pois sei que todo o pensamento naufraga em labirintos infinitos. É como respirar fundo com a cabeça embaixo d’água, em qualquer privada de motel. O abrigo perfeito seria entre as coxas das moças que nem sei o nome. Adoro perder-me entre umbigos, virilhas e pentelhos.
§Ainda me lembro da minha primeira trepada com a mulher que sequer amei de verdade. Recordo que nunca presenteei minhas paixões com flores, nem dei bombons às amantes em cada noite desmaiada entre seios e anseios por qualquer néctar. É irritante achar que sou um homem vigoroso, apenas por ficar de pau duro. Chulo? Pode ser. Mas não menos sincero que todas as ejaculações banais que nós, garanhões cretinos, costumamos desperdiçar por aí.
§Para entender o que é gostar de uma mulher de verdade, eu necessito de um estimulante alucinógeno. Simplesmente para me drogar toda vez que a vida se transforma em algo suportável. Tipo casamento, TPM e vitrines de shoppings. Não se pode quantificar a angústia, ou classificar a dor de quem jamais aprendeu a entender esta espécie sedutora e irritante que só quer amar. Será?
§Amor é complexo. Uma palavra-medo que contrai o diafragma e leva o estômago à boca. Eu apenas quero solidão e todas as mulheres ao meu lado. Sou cretino, cruel e apetecido por deltas e olhares fatais. Não quero que ninguém me julgue, por favor. É instinto misturado ao machismo. Tudo lecionado de pai para filho, geração após geração.
§Também conheci damas que afirmavam que monogamia é tédio. Outras me deram na cara, porque deixei claro que só queria a xoxota. Palavra de baixo calão! Desculpe, é que eu aprendi que ser educado é ficar em silêncio. Mas eu berro. Ainda não encontrei alguém para fazer com que as palavras sumam. Sei que preciso aprender a ser homem além cama. Tudo para permitir que algum verdadeiro afeto me aconchegue em uma única voz. Que cale a minha fala entre a cama e os olhares. Não adianta, pois sempre que alguma mulher fecha a minha boca, as palavras se entreabrem. Assim como as suas pernas.
Bruno Cazonatti

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Poética

.
Tem que ser
de improviso
sem nenhuma
razão
de existir
.
Pedra lascada
do instante
inútil absurdo
abstrato
.
Se mastigo
demais
o poema acaba
engolido.
Wilson Guanais

Retalhos

.
Escrevia no jornal
no guardanapo do café
no verso do post-it
no talão do mercado
no extracto bancário
na areia da praia
na palma da mão
no tampo sanitário
.
Escrevia frases fingidas
recados engravatados
e palavras mutantes
de sufixos inúteis
escrevia inícios sem fim
de fins sem inicios
em pontuação
e sem intenção
.
Escrevia diálogos
Escrevia receitas
Escrevia retalhos
Ana Oliveira

Lágrima

.
E tudo se finda com uma lágrima
No peito cerrado a dor reside
Queima, corta, espanca, agride
Esbofeta a cara de alguém que ama.
.
No céu, um sol sem cor
O que outrora era colorido, preto- e- branco ficou
Esperança, sorriso, juras de amor
Com a tristeza, silêncio,indiferença findou
.
A dor que no peito rasga
O nó que na garganta insiste
E a dúvida que dentro indaga
Se em teu peito o amor existe
.
E tudo se finda com apenas uma lágrima...
Arianna M. Andrade

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Dias atuais

.
Uma vez fui abduzido
Para uma cama estrangeira
Um país distante
A menina nem tanto
Nua com todas as curvas
Mal pude respirar
Não tinha tempo
O seu pai ia chegar
Falei umas besteiras
Que amanhã nem lembrará
A possuí com camisinha,
Cachaça, uns tapas.
Em cima da cama,
Da pia, da banheira.
No final o que sobrou?
Seu nome, por favor...
Valéria Telles

A Poesia

.
A poesia me marca como pasto à meia-noite,
Quando a coruja pia e o mundo gira no escuro
A poesia é a garrafa maldita da dor ocre,
Do corpo que goza mas nunca peca.
.
A poesia é o direito de dizer Opressão!
Quando os homens se maltratam e nõ se abraçam
.
A poesia é o amaldiçoar o inanimado
E se proteger com as asas dos anjos...
A poesia é conhecer você!...
Éric Meireles de Andrade

Pedaço de mim

.
Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar
.
Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais
.
Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu
.
Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi
.
Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Leva os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus.
Chico Buarque

terça-feira, 17 de junho de 2008

Versos de Exclusão

.
Escrevo poesias minhas,
para o meu bem querer,
para meus olhos,
sobre minha vida.
São poesias sem sentido,
como as suas.
.
Escrevo poesias sobre mim,
sobre meus olhos diante da vida,
sobre minha vida diante de teus olhos,
para a ausência de seu bem querer para mim.
.
Escrevo poesias em fogo!
.
Escrevo poesias em fogo,
grito de ignorância,
choro em fúria,
proclamo minha trágica poesia em tiros.
.
Proclamo minhas poesias em tiros!
.
Escrevo poesias em fogo,
ninguém escreve poesias para mim.
Escrevo poesias sobre mim,
impossíveis de não serem ouvidas,
e ninguém mais escreve sobre mim,
ninguém mais.
Silas Delgado

Reclusão

.
Como aquele a desmaiar subtamente,
sem escolha,
sem momento,
sem mente,
semente cruel germinada,
subtamente sofro da cegueira dos ciúmes latente.
.
Ciúmes.
.
Correia de irracionalidade,
irracionalidade instintiva,
espremes meu coração tanto que o deixa pequeno,
e meus bofes são postos pra fora em forma de silêncio.
.
Silêncio.
.
Silêncio mortal para nós,
silêncio grito de dor,
silêncio súplica,
silêncio expressão de meu distanciamento do amor.
.
Distanciamento.
.
Distanciamento porque prefiro adiantar a dor,
enquanto em meu controle,
como se o amor tivesse controle,
do que desconta-la em ti.
.
Por ti.
.
Quanto a dor do ciúme e o medo de te perder,
prefiro ser egoísta há não ser,
não devolverei tamanha carga que me deu e engoli,
faço isso em nome do bem querer,
faço por ti.
Silas Delgado

Soneto de Domingo

.
Não tarde mais dum instante
O bocejo no ar da boa noite
Embalado na música do açoite
Deitado em casulo variante.
.
Quisera ter deste fim apenas o lume
Que brasa inofensivo no cume do incenso
E ser em lembranças somente um pretenso
Jardineiro que no jardim seu mundo resume.
.
Porém são maiores os dias no calendário
Perfilam sentinelas com velas em mãos
Iluminam sem dó tal qual dor de cera em pingo.
.
Personagem real antes que imaginário,
Resumido ao nu dos noturnos desvãos,
Entregue ao desuso de um ignóbil domingo.
Benito Francisco Vasques

Faz Tempo

.
Os anos se passaram em seu devido lugar
Deixando registros outrora jogados no esquecimento
E agora estamos aqui pra lembrar
Que o tempo vai cuidando das horas
E as horas vão matando o tempo
Faz tempo
Que eu esqueço das horas
E as horas vão matando o que penso
O tempo traz a história do mundo nas costas
Tudo isso vem no sopro do vento
Tão perto, tão longe
Hoje o chão passa rápido e perto do futuro
Me distancio daqui pra lembrar que estarei no amanhã, se precisar
A memória resiste ao que o tempo insiste em acabar
Quem se lembra, quem se lembra onde queria chegar
Ninguém sabe, ninguém sabe onde tudo vai dar
Faz tempo
Que eu esqueço das horas
E as horas vão matando o que penso
O tempo traz a história do mundo nas costas
Tudo isso vem no sopro do vento.
Jorge du Peixe

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Uma possibilidade

.
Um silêncio grande veio sobre mim
como um espírito ou algo assim que desce.
O que falo, quando falo, me custa,
estabeleço prejuízos irreparáveis,
gasto fortuna que não tenho.
Não há sabedoria, nem escuridão, só mudez.
Um anúncio me foi confiado,
mas recolho o impulso que me formaria a voz.
Guardo o ar que respiro para o que sinto,
algo como amar por amar e rir por viver.
Fez-me o silêncio um estranho,
mas me acostumo assim, outro feito de mim.
Fico fora de um eixo, alterado, crucificado sem dor,
grudado em lentidão nos instantes,
hipnotizado pelas insignificâncias do cotidiano.
Ao mesmo tempo vôo, pássaro ligeiro,
asas com penas levíssimas de prata,
para talvez pousar sobre o girassol de um dia diferente.
Me deixe assim, em silêncio, não me tente animar;
há uma possibilidade de não ser tristeza.
Dauri Batisti

sábado, 14 de junho de 2008

Ai se sesse

.
Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse
Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse a porta do céu e fosse te dizer qualquer tolice
E se eu arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Tavés que nois dois ficasse
Tavés que nois dois caisse
E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse
Zé da Luz

Brasil

.
Gotejando os dias,
dia após dia,
percebo,
que gotas de dia não explica,
caixa d'água onde afoga.
.
Conta-gotas de dias,
o que lavas?
Se tuas águas são de caixa d'água,
e chovem no molhado,
de terra nova e amarga,
neste continente torto.
.
Continente torto,
a coruja de Atenas paira sobre,
com nossas cabeças,
tortas.
Não seja um dos lobos,
mansos,
que comem,
bebem,
cagam,
se afogam,
e guardam tudo pra eles.
.
Continente torto,
olhe para si,
endireite-se,
entenda:
gotejando os dias,
dia após dia,
perceba,
que gotas de dia não explica,
caixa d'água onde afoga.
Silas Delgado

Jardim Esquecido

.
Foi-se embora do meu jardim,
Desesperada pelo aroma das rosas e jasmins
Retirou as sementes que plantei em sulco umedecido
Abandonou a pá e o adubo num canto de castigo
E se calou com espinho e cerca de boquim.
.
Foi-se embora do meu jardim,
Sem deixar nem um bem-me-quer como consolo arredio
Enterrou o cravo para embelezar um destino vazio
Afogou os lírios em surtos de arlequim.
.
Foi-se embora do meu jardim
Arrancou o mato tenro das lembranças vividas
E se benzeu em banho de alecrim
.
Foi-se embora do meu jardim
E secou o amor que prometeu a mim...
.
Foi-se embora do meu jardim...
Éric Meireles de Andrade

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Denso Vazio

.
Em um amor não correspondido,
acabei entrando,
em um labirinto sem saída,
acabei ficando,
sem saber o que fazer,
vou me afundando,
em uma maré de ondas negras,
me matando;
.
Minha vida sem sentido,
vou levando,
sem saber onde ir,
me assustando,
no silêncio de um vazio,
ouvindo vozes;
.
O fogo ardendo minha alma,
me sentindo sem vida,
sinto meu coração dizendo,
por sua causa estou vivida.
Maria Angélica D. Gonçalves

O Quadro

.
O quadro vem e desponta,
Belo, vigoroso, significativo e iluminado,
Rompe a parede dos tempos,
Dos pregos e das opressões
Para despontar na eternidade.
.
Mas os quadros não sentem,
Não se olham e não se encontram.
Ficam lá... estáticos...
Na busca de serem admirados...
(A arte não supera a vida da humanidade.
É dos homens que nasce a estética do tom,
Da mímeses, conjuntura e sabor em espiá-las)...
Éric Meireles de Andrade

Velha chácara

.
A casa era por aqui...
Onde? Procuro-a e não acho.
Ouço uma voz que esqueci:
É a voz deste mesmo riacho.
Ah quanto tempo passou!
(Foram mais de cinqüenta anos.)
Tantos que a morte levou!
(E a vida... nos desgastamos...)
.
A usura fez tábua rasa
Na velha chácara triste:
Não existe mais a casa...
.
- Mas o menino ainda existe.
Manuel Bandeira

Bundalização

.
No sexo de suas esdrúxulas músicas,
Coube em si, somente o fugaz.
Assim, a humanidade perde sua consciência
E a razão não existe mais.
.
História, sentimentos, e lutas de classes
São tapadas e fantasiadas
No balanço do bumbum e "no movimento é sex"
Constituindo-se assim a alienação corpo-mente,
Tão demente, que o homem se embudece...
Éric Meireles de Andrade

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Na veia

.
Eu vou cantar pra saudade com seu vestido vermelho e a sua boca
Eu vou cantar pra saudade descer na minha cabeça e comandar sua festa, festa.
.
Aquele cheiro som imagem do teu corpo incendeia
E um rio carregado de saudade vem correr na minha veia
Na veia amor, na veia.
É como a luz da lua que atravessa a parede da cadeia
Clareia mais forte que o sol.
.
E Quando a saudade chegar com seu batalhão de agitadores
E tanta bandeira
Vou cantar aquele som da gente
Vou rasgar o teu vestido novo.
Lirinha

Ana e o Mar

.
Veio de manhã molhar os pés na primeira onda
Abriu os braços devagar... e se entregou ao vento
O sol veio avisar... que de noite ele seria a lua,
Pra poder iluminar... Ana, o céu e o mar.
.
Sol e vento, dia de casamento
Vento e sol, luz apagada num farol
Sol e chuva, casamento de viúva
Chuva e sol, casamento de espanhol.
.
Ana aproveitava os carinhos do mundo
Os quatro elementos de tudo
Deitada diante do mar
Que apaixonado entregava as conchas mais belas
Tesouros de barcos e velas
Que o tempo não deixou voltar.
.
Onde já se viu o mar apaixonado por uma menina?
Quem já conseguiu dominar o amor?
Por que é que o mar não se apaixona por uma lagoa
Porque a gente nunca sabe de quem vai gostar.
.
Ana e o mar... mar e Ana
Histórias que nos contam na cama
Antes da gente dormir.
.
Ana e o mar... mar e ana
Todo sopro que apaga uma chama
Reacende o que for pra ficar.
.
Quando Ana entra n'água
O sorriso da ma-drugada
se estende pro resto do mundo
abençoando ondas cada vez mais altas
barcos com suas rotas e as conchas que vem avisar
desse novo amor... Ana e o mar.
Fernando Anitelli

Fim

.
Me sinto perto de escrever poesia morta,
me mato de pensar em sentimentos novos,
me mato de pensar,
me mato.
.
Surpreendentemente esse peito não é suficiente,
a felicidade apenas contente,
com tosca e tamanha aspereza,
nada mais,
a tristeza,
que triste.
.
O amor?
Já senti.
A dor?
Já senti.
A paixão?
Também...
O ópio?
Também...
O vão?
Sinto.
A morte?
...
fim.
Silas Delgado

Calados

.
Momentos de silêncio simples e puro em sua companhia,
olhos nos olhos de janela da alma,
o não-dizer nunca disse tantas coisas como diz ao seu lado,
uma boca fechada nunca chupou tanto,
um corpo nunca servira como manto azul,
o meu bem-querer nunca fôra tão santo.
.
Tua respiração compassa meu sangue,
em nossas lágrimas transbordamos,
choramos pela felicidade plena de "estar"
viver momentos,
viver o momento,
com todos os percalços mundanos ajoelhados diante de nós,
diante da divina grandiosidade de nosso amor,
diante da perfeição,
diante da ausência de dor.
.
Momentos que sinto calma,
a sagrada calma,
poder me deixar pela felicidade,
pelo sopro dos anjos,
me levando a porto seguro,
vila de ranchos.
.
Momentos onde só é dito o verdadeiro:
"Eu te amo".
.
Momentos onde só é dito o que se quer escutar.
Silas Delgado